A 1ª Vara Federal de Carazinho (RS) negou os pedidos por indenização feitos por familiares de três indígenas que morreram em um incêndio em uma cadeia localizada na Terra Indígena de Alto Recreio. Na sentença que julgou quatro ações, publicada em 9/10, o juiz Cesar Augusto Vieira entendeu que não houve conduta omissiva por parte da Fundação Nacional do Índio (Funai) e que ela não é responsável por eventuais atos ilícitos praticados por indígenas.
As famílias narraram que dois homens e uma mulher estavam presos em uma cadeia na Terra Indígena de Alto Recreio, no município de Ronda Alta (RS), quando o local começou a pegar fogo, levando os três à morte. Sustentaram que a Funai sabia que na aldeia havia um local para aprisionar infratores e admitia aquela prática. As famílias dos dois rapazes requereram indenização por danos morais, enquanto a família da mulher solicitou que o filho da falecida – que possui cinco anos - receba pensão mensal por danos materiais.
A Funai contestou, alegando que não agiu de maneira omissiva. Sustentou que as comunidades possuem autonomia para se organizarem e que orienta que sejam sempre respeitados os direitos humanos.
Ao analisar o caso, o juiz verificou que, para a responsabilização da Funai, é necessário que fique caracterizada a omissão do agente, o dano causado e o nexo entre omissão e dano. Ele também observou que, embora a Funai seja responsável pela proteção das comunidades indígenas, a Constituição Federal prevê que as formas de vida e a organização dos povos indígenas devem ser respeitados. Dessa forma, as comunidades possuem autonomia para organizar suas questões internas, inclusive as disciplinares.
A partir dos documentos anexados ao caso, o magistrado constatou que a prisão dos indígenas foi motivada por uma briga ocorrida em uma festa e que o incêndio se deu no mesmo dia da prisão. Ele apontou que os autores não apresentaram provas de que a Funai sabia da existência da cadeia e das suas condições de segurança.
O juiz destacou que, “considerando a evolução do ordenamento jurídico quanto aos povos indígenas, não vislumbro um dever de vigilância da FUNAI sobre os indígenas, mas, sim, um dever de proteção. Não se conclui, após análise das provas dos autos, que a FUNAI detivesse pleno controle e, por isso, responsabilidade, em evitar o processo de prisão das vítimas e sua morte, naquelas circunstâncias”.
Vieira ressaltou que os indígenas possuem autodeterminação para decidirem suas ações e respondem pelos seus próprios atos. “Assim, embora a FUNAI tenha o dever de proteção dos usos, costumes e bens das comunidades indígenas, disso não se extrai fundamento suficiente para a sua responsabilidade civil por eventuais atos ilícitos praticados por indivíduos integrantes de tais núcleos”.
O magistrado julgou os pedidos improcedentes. Cabe recurso ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.